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As finanças: de onde vêm e para onde vão?
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As finanças: de onde vêm e para onde vão?

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Uma das questões mais sérias para uma organização política são as suas finanças. Isto é, seu patrimônio material que amplifica sua atuação na esfera política. Da mesma forma que a posse de uma gráfica garante a impressão dos jornais, panfletos e lambes de uma organização, um carro garante maior facilidade para giros e deslocamentos entre tarefas. Logo, apesar de não garantir uma boa atuação política, as finanças de nossa organização podem amplificar grandemente nosso potencial político.

De fundo, já há uma questão: se a posse de patrimônio (podendo ser meios de produção, como uma gráfica) vale bastante, ela nem sempre é possível. Por insuficiência de recursos ou questões de segurança, o bem mais flexível (por ser móvel) e mais potente (por ser meio de troca universal) acaba sendo o dinheiro. Assim, quando falamos de finanças para uma organização revolucionária, acabamos falando de dinheiro, pois essa é a forma geral da riqueza no capitalismo.

Transformamos, então, a pergunta de “como nossa organização pode fazer finanças?” para “como nossa organização pode fazer dinheiro?”. Devemos explorar essa questão delicada sem moralismo ou preconceitos, mas com apenas um guia claro: a estratégia da revolução socialista. Pois nenhuma tática, nem mesmo financeira, pode se sobrepor à estratégia revolucionária que adotamos.

Podemos colocar da seguinte forma: nenhuma tática de finanças pode prejudicar o esforço revolucionário, seja reproduzindo comportamentos nocivos, seja prejudicando a confianças das massas na organização. As finanças de uma organização revolucionária devem ser fortalecidas pela confiança da classe trabalhadora, baseando-se em sua solidariedade, não em sua espoliação.

Os perigos de uma abordagem irresponsável nas finanças

Hoje vivemos no Brasil um período de crise prolongada, onde as altas taxas de desemprego e informalidade corroem o poder da classe trabalhadora. Onde os baixos salários são cada vez mais abocanhados por uma política econômica rentista e por uma tributação que ataca os mais pobres. Nesses períodos de crise, surgem todo tipo de abutre para se alimentar do que resta da classe trabalhadora.

Talvez, um dos elementos mais recorrentes hoje sejam os diversos tipos de fraude, estelionato e corrupção. Por exemplo, os “tigrinhos”, as fraudes que pedem PIX e o recém descoberto esquema de corrupção no INSS. Logo, para as sanguessugas, pode parecer viável aproveitar desse ambiente geral de fraudes para emplacar algumas “em prol” da causa revolucionária. Afinal, se já fazem tanto, que pelo menos uma rifa falsa engorde os caixas da revolução, não?

Mas é somente o taticismo vazio que pode trocar as mãos pelos pés dessa forma. Podemos simplesmente responder: não é por sermos bonzinhos, por moralismo, que renunciamos ao estelionato, mas porque a confiança da classe trabalhadora, das massas, é de valor incalculável. E não há dinheiro coletado numa atividade que valha arriscar essa confiança em nossa organização. Somos comunistas, e para nós, falar a verdade e ganhar a confianças da classe é imprescindível ao nosso esforço revolucionário.

Na mesma linha, há as organizações que, ao ganhar uma eleição e dirigir uma entidade, limpam seus caixas e desviam seus fundos. Supostamente “em prol da causa revolucionária”, arriscam destruir a confiança da classe representada em suas próprias organizações de massas. Posteriormente, estarão se perguntando porque a massa não participa e defende suas entidades, e porque sua posição nestas é frágil ao ponto de tremer com a mínima expressão de movimento na base.

Não é uma questão de medo, mas de princípios

Pode ser que alguns nos acusem de ter medo do Estado burguês, de estar sendo legalistas ou puristas. Mas claro que nunca dirão isso em voz alta, já que todas essas práticas nefastas são feitas por baixo dos panos. Para esses, respondemos que o que não faltam são exemplos da retidão histórica dos comunistas, dos revolucionários, em relação a questão financeira.

Lembremos que os guerrilheiros urbanos na ditadura, que muitas vezes se sustentavam com assaltos, assaltavam bancos, e não trabalhadores. Os mesmos companheiros que desafiaram toda a legalidade burguesa e se lançaram na luta armada, recusavam-se a roubar os trabalhadores. E faziam isso porque precisavam conquistar as massas.

O mesmo ocorreu durante a Guerra Civil Chinesa, em que o Exército comunista tinha em seus princípios: não pegar nada a força dos camponeses. Contrapondo-se às forças burguesas, que os enxergavam como massa a ser explorada, os comunistas se colocaram pelos camponeses, respeitando suas condições materiais.

Uma política de finanças revolucionária

Por outro lado, há bases estabelecidas para consolidar uma política de finanças condizente com uma organização revolucionária. Como indicado no XVI Congresso Nacional do PCB, são 3 formas fundamentais de levantar fundos: 1) a contribuição mensal dos militantes – o pagamento das cotas – 2) as contribuições eventuais de simpatizantes – o circulismo – e 3) os recursos provenientes de atividades promovidas pelas instâncias.

A contribuição mensal dos militantes, estabelecida dentro da UJC como obrigação de todo e cada militante, é expressão de seu vínculo material e orgânico com a organização. Essa é a pedra fundamental das nossas finanças e expressa uma correlação direta entre trabalho político e capacidade material: quanto mais militantes orgânicos temos, maior é nossa arrecadação.

Já o circulismo expressa claramente a confiança da classe trabalhadora, das massas, da nossa base de atuação em nosso trabalho político. Ele se materializa nos recursos doados por simpatizantes que reconhecem nossos trabalhos nas bases, bem como por entidades e sindicatos que financiam conscientemente as atividades militantes que organizamos e levamos à frente. Seja na compra de um jornal por um colega, seja no envio de um ônibus por um sindicato, o circulismo é a marca de uma relação de confiança com a base.

Por fim, as atividades de finanças, pontuais ou recorrentes, simbolizam a consciência dos militantes sobre a necessidade de independência financeira – e, portanto, política – da nossa organização. Ao mesmo tempo, expressam a capacidade de nossa militância de compreender a organização da classe em seu local de atuação e, com base nisso, propor atividades culturais, políticas ou mesmo puramente financeiras que ressoem em sua base. Na organização de uma calourada ou na montagem de uma banquinha, a disciplina e a atenção dos militantes é essencial.

Por uma linha correta

Em matéria de finanças, o esquerdismo limita o escopo da atuação, defendendo um purismo que só pode resultar no estrangulamento das finanças da organização. Mas o oportunismo é ainda mais corrosivo, sacrificando o futuro para obter migalhas no presente, invertendo as prioridades. Para evitar tanto o sufoco quanto a desonestidade, uma política revolucionária caminha a passos firmes – mesmo que, por vezes, lentos – com as massas.

Por Guilherme Corona