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Sobre o código disciplinar discente na UFJF
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Sobre o código disciplinar discente na UFJF

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Um processo nacionalmente preocupante

Nos últimos anos, dentro dos Institutos Federais de Educação, tem-se discutido a criação de uma regulamentação das condutas dos discentes. Esse processo tem sido construído a partir de alguns denominadores comuns: documentos construídos hegemonicamente pela Administração Superior, extremamente punitivista e burocrática.

É notória também a imposição de punições graves para as manifestações estudantis, sejam elas intervenções artísticas no campus ou práticas políticas do movimento estudantil1. Além disso, tem sido recorrente a criação de obstáculos para a participação dos estudantes na elaboração desses documentos.

Sobre o processo na Universidade Federal de Juiz de Fora

Desde o segundo semestre de 2023, o Movimento Estudantil da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) tem sido permeado por essa discussão, denominada aqui como Código Disciplinar Discente e posteriormente renomeada como Estatuto Discente.

Sua primeira versão foi redigida por docentes, diretores, pró-reitores e membros do Conselho Superior (Consu2). Nessa versão, não havia menções sobre casos de opressão, tampouco existia uma seção específica que assegurasse “o direito do discente ofendido”3, entre diversos outros problemas. Durante todo o processo, lidamos cotidianamente com a pressão da Administração Superior, que indicava a urgência na aprovação do Estatuto antes do término da gestão do reitor Marcus David4, alinhado ao Partido dos Trabalhadores (PT).

O documento do Estatuto Discente apresentava mais de 20 páginas que delimitavam os direitos e deveres dos alunos de maneira punitivista, trazendo artigos que estabeleciam sanções administrativas graves para situações ínfimas, restrição da expressão artística e criminalização das manifestações do movimento estudantil. Além disso, abordava o Colégio de Aplicação João XXIII, mesmo sem haver nenhuma discussão qualificada desse caso específico.

Durante os últimos seis meses, a União da Juventude Comunista (UJC) e o Movimento por uma Universidade Popular (MUP) estiveram presentes em todos os Conselhos de Centros Acadêmicos (CAs) e Diretórios Acadêmicos (DAs) (CONCADA5) da UFJF. Vale ressaltar que a atual gestão do Diretório Central dos Estudantes (DCE) – composta por membros das juventudes do PT, Levante Popular da Juventude, UJS, Afronte e JPDT – apresentou apenas um documento de propostas de alteração na primeira reunião em agosto. Desde então, a gestão tem desempenhado o papel de mediadora, enquanto as proposições de alteração da minuta partem somente de alguns CAs e DAs que essas forças não constroem.

Conseguimos avançar em alguns aspectos, desde a construção de ações educativas – que trazem um viés de tratamento das infrações diferente de somente punições – até a elaboração de uma seção que resguarda os direitos do discente ofendido. No entanto, as discussões estão longe de estarem esgotadas ou suficientemente divulgadas entre o corpo docente da UFJF e a maioria dos alunos, muitos dos quais sequer sabem da existência dessas conversas.

Além da pressa injustificável do Consu, o contexto vigente também é marcado pelo esvaziamento dos espaços de deliberação estudantil por parte dos CAs e DAs ativos, bem como por uma grande escassez de agitação e mobilização para promover o debate por parte da atual gestão do Diretório Central dos Estudantes.

Cenário atual

Na última semana, a Administração Superior solicitou que fosse enviado, com um prazo impraticável de apenas um dia, tanto o Texto Final quanto o Relatório da Comissão. No entanto, o relatório não incluía os pontos de divergência defendidos pelo movimento estudantil. Durante a reunião do Concada, foi deliberada a necessidade de convocação de uma mobilização estudantil mais robusta no dia do conselho, bem como a divulgação de um documento que elencasse as ponderações dos estudantes. Contudo, assim como em outros momentos, a gestão Um Passo à Frente não cumpriu com os encaminhamentos, evitando qualquer embate com a Reitoria.

Sexta-feira, dia 8 de março, o Conselho Superior convocou uma reunião extraordinária com pauta única: o Estatuto Discente, para o dia 12 de março, coincidindo com o segundo dia de aula do calendário regular da universidade. Estes elementos evidenciam que a condução da aprovação deste estatuto nesta semana é uma estratégia para diminuir a mobilização e a participação estudantil, já que estabelece um prazo impraticável para que o documento seja devidamente discutido entre o corpo docente, discente e técnico-administrativos em educação (TAEs). Reconhecemos essa manobra política, uma vez que diversas comissões têm seus trabalhos paralisados há anos, enquanto esta, em específico, é tratada com urgência e calendários que dificultam a participação dos estudantes. Infelizmente, o DCE parece ser condescendente com essas táticas.

A reunião realizada no dia 12 de março aprovou o Estatuto Discente, que apesar de conter artigos sugeridos por representantes dos DAs e CAs, não contou com uma ampla divulgação nem com a participação da comunidade acadêmica da UFJF.

Nesse sentido, a UJC-JF e o MUP-JF se colocam completamente contrários à aprovação do Estatuto Discente, tanto por seu conteúdo inóspito quanto pelo processo de construção velado e antidemocrático.

Acreditamos que uma normativa que verse sobre os direitos e deveres dos estudantes deve ser construída em conjunto por todo o Corpo Acadêmico e para todo o Corpo Acadêmico, em prol da melhoria do ambiente universitário e da construção de uma universidade popular!

UJC e MUP de Juiz de Fora

13 de março de 2024


  1. Como o catracaço ou as barricadas para fechamento de prédios durante reivindicações, paralisações e greves. ↩︎
  2. O Consu/UFJF é o órgão máximo de deliberação interna da instituição, com definição estatutária. Possui função normativa, deliberativa e de planejamento da UFJF. ↩︎
  3. O termo “direito do discente ofendido” tem origem no Direito, especificamente nos “direitos do ofendido”, que se referem aos direitos daquele atingido pelo ato, como a vítima. Dentro desta seção, buscamos garantir a possibilidade de mudança de turma ou turno, extensão de prazos para entrega de atividades avaliativas, ponto facultativo, entre outras medidas que podem ser necessárias em diversos casos, como os recorrentes de assédio moral e sexual. ↩︎
  4. O processo de Consulta Popular para a Reitoria 2024/2028 ocorreu em outubro de 2022 e resultou na vitória de uma chapa de continuidade da gestão de Marcos David e que também está alinhada ao Partido dos Trabalhadores (PT). ↩︎
  5. Os Conselhos de CAs e DAs (CONCADA) são órgãos de deliberação entre os estudantes de graduação da UFJF. Suas deliberações são superiores à da gestão e inferior à das assembleias estudantis. ↩︎