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RESOLUÇÕES DO 1º SEMINÁRIO NACIONAL DE UNIVERSIDADE POPULAR (SENUP)
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RESOLUÇÕES DO 1º SEMINÁRIO NACIONAL DE UNIVERSIDADE POPULAR (SENUP)

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Carta de Porto Alegre

A universidade como entidade pretensamente neutra e universal já não consegue esconder suas contradições. Os conflitos sociais já não podem ser ocultados, o povo reivindica o que é seu em plena luz do dia. Entra em cena clamando por transformações profundas e já não se contenta com migalhas. Quer que as instituições – tantas vezes reprodutoras das desigualdades que o oprimem – sejam parte do grande bloco que batalha uma história protagonizada novamente pelos “de baixo”.

Em lugar da Universidade velha e arcaica, quer a Universidade do povo. Derruba a Universidade privatizada, constrói a Universidade do povo. Morre a Universidade elitizada, nasce a Universidade do povo. Não quer o “popular” como sinônimo de precariedade, mas excelência para todos. Sai a Universidade precarizada, entra a Universidade do povo. Instituição que no nome retoma o sentido do universal ao caracterizar o sujeito que a protagonizará: essa é a Universidade Popular.

Se os movimentos emancipadores encontram-se na defensiva, não implica que não haja resistências amplas e também localizadas. Mas as classes dominantes tremem ante a possibilidade de seu domínio global ser contraposto por um projeto igualmente global. É parte da sua estratégia impedir-nos de constituir a nossa. E justamente na unidade dos diferentes agentes, táticas de atuação nos vários âmbitos, e um objetivo estratégico comum é que reside a possibilidade de derrotar o atual modelo de Universidade.

Não é um caminho rápido nem fácil. Mas a sua complexidade não deve implicar qualquer desânimo ou imobilismo. É preciso avançar coletivamente, enfrentando os dilemas e escolhendo os caminhos a cada encruzilhada encontrada. Fundamentalmente, é manter o espírito coletivo em torno de políticas concretas, colocando toda a energia transformadora em movimento.

Com esse espírito, estivemos reunidos nos campi da Universidade Federal do Rio Grande do Sul nos dias 2, 3 e 4 de setembro de 2011, e agora compartilhamos os principais acúmulos de discussão do I Seminário Nacional de Universidade Popular (SENUP). São propostas de políticas que emergiram consensualmente dos diferentes Grupos de Discussão temáticos. Elas não expressam necessariamente a opinião homogênea de todos os participantes do SENUP, mas sugerem alguns dos caminhos possíveis para a construção da Universidade Popular.Venceremos!

Porto Alegre, 4 de setembro de 2011.

Deliberações DO I SENUP1

A Universidade hoje e a Universidade Popular

Lutar por uma Universidade Popular significa compreender a necessidade de ligar as tarefas imediatas de nosso movimento com a construção de um projeto de universidade alternativo ao projeto do capital.

Temos, nos últimos tempos, um direcionamento “lento e gradual” das instituições educacionais às necessidades de acumulação do capital, com uma aceleração na década de 90 e em especial no século XXI. Este direcionamento se manifesta: na reestruturação político-pedagógica da maioria dos currículos dos cursos de graduação, subordinando as iniciativas da universidade às necessidades do mercado, em detrimento das demandas da população; na entrega da estrutura física e de recursos humanos públicos para a produção de ciência e tecnologia de acordo com as necessidades da iniciativa privada, o que compromete a autonomia didático-científica das universidades; uso do dinheiro público para salvar empreendimentos universitário privados; na diminuição dos recursos públicos relativos a quantidade de vagas abertas nas universidades públicas, que aumenta a precarização e intensificação do trabalho, diminui a qualidade de ensino, inviabiliza a manutenção do tripé ensino-pesquisa-extensão voltado aos interesses populares e incentiva as instituições a buscar outras fontes de financiamento paralelas ao Estado; nos parcos mecanismos democráticos que permitam à comunidade universitária interferir nos rumos tomados pelas instituições; etc.

A formalização deste conjunto de medidas tem aparecido em decretos, medidas provisórias, leis recentes que, por seu caráter fragmentado, ofuscam a gravidade do processo pelo qual um direito se converte em mercadoria, e uma autarquia, em tese pública e autônoma, em uma prestadora de tais serviços. Exemplos desses projetos são o decreto das Fundações, o SINAES, a Lei de Inovação Tecnológica, a Universidade Aberta do Brasil, o PROUNI, o REUNI, o chamado “Pacote da Autonomia”, e mais recentemente projetos como a lei 7.423, o PL 1749/11 (antigo MP 520) e a lei 12425 (antiga MP 525) que tratam, respectivamente, da relação das universidades com as Fundações “ditas” de Apoio, da gestão dos Hospitais Universitários (HU´s) e da possibilidade de ampliação dos contratos temporários nas Instituições Federais de Ensino Superior (IFES).

Este processo nos leva a concluir que o projeto hegemônico para a universidade brasileira é global e dinâmico, e que nossa tarefa de questioná-lo e contrapô-lo exige que trabalhemos não somente a partir de ações pontuais e reativas a seus avanços, mas principalmente a partir da formulação de um projeto alternativo igualmente global. O desenvolvimento desse projeto, a que chamamos popular, e sua construção cotidiana na universidade e fora dela são os eixos de nossa luta. É necessário, por isso, situar em que patamar se encontra a construção desse projeto popular para a universidade.

A educação não é determinada somente pelas instituições formais (escolas, universidades, escolas técnicas etc). Estas são uma parte importante na totalidade dos processos educacionais, mas somente uma parte. Temos, assim, a seguinte equação:

1) temos os processos educacionais como um todo. Falamos de um sistema de internalização de valores, hábitos, princípios morais e éticos da sociedade vigente, especialmente de sua classe dominante. Isto significa que estamos falando de indivíduos sociais que, mesmo não tendo qualquer nível de escolaridade, também são educados pela sociedade e levados a assumir seu ponto de vista de forma “natural”. O egoísmo, o individualismo, que se afirmam na tendência a resolver problemas sociais de forma privada, a desumanização, indiferença em relação à barbárie social e o sofrimento humano são apenas exemplos de como a sociedade nos educa a aceitar um modo de vida social tão absurdo, e isto independe da escolaridade;

2) e temos as instituições educacionais. Aí, os indivíduos sociais já são induzidos a uma aceitação ativa das normas sociais pré-estabelecidas. Tanto mais ativa será esta aceitação, quanto mais elevado o nível de complexidade de que estamos falando. Na universidade, chegamos ao entendimento da gênese abstrata de conceitos e teorias que asseguram a legitimação e a reprodução da ordem vigente.

A mediação entre os dois pontos acima já nos leva a um elemento necessário para nossa luta: ela se insere dentro da luta social em geral, o que faz com que a universidade não possa ser transformada de forma permanente por si só, assim como ela, por si só, não pode empreender uma alternativa emancipadora radical. No entanto, isso tampouco nos leva a dizer que a universidade é um “caso perdido”, pois, sendo ela uma manifestação de toda a estrutura social e de seu processo educativo, isso significaria abdicar da possibilidade de qualquer transformação social, dentro ou fora da universidade. Pelo contrário, devemos reconhecer essa instituição como um “caso em disputa”, como parte do processo mais amplo de disputa ideológica e material da sociedade. Se as universidades exercem um papel crucial para a reprodução da ordem vigente, também exercem para a resistência e para proposição alternativa, a partir de uma disputa “de dentro para fora” e “de fora para dentro”.

Acreditamos que na realidade brasileira, é fundamental a resignificação da palavra povo. Em um país onde a revolução burguesa ocorreu de cima para baixo, divorciada de uma revolução nacional e democrática, combinando autocracia e dependência com uma modernização conservadora e uma democracia restrita e para as elites, as alternativas populares se divorciaram completamente do bloco de poder dominante, que se tornaram antagônicos entre si. É nesse bojo que se encontram algumas lutas fundamentais de nosso povo, como pela reforma agrária, reforma urbana, pela estatização de empresas estratégicas, etc. A luta pela Universidade Popular, então, se liga a um conjunto de tarefas imediatas da luta “dentro da ordem”, de abertura de espaço democrático e conquista de hegemonia popular e que, ganhando vitalidade enquanto movimento, deverá caminhar para uma luta “contra a ordem”. Dessa forma, o debate em torno de uma Universidade Popular se revela muito mais do que uma oposição às “reformas” universitárias atuais, visto que se insere na reflexão ativa sobre outro projeto de sociedade, a ser protagonizado por todos setores explorados e oprimidos pela sociabilidade vigente.

Como princípios, defendemos:

– Articular a luta por uma Universidade Popular com a luta pela Educação Popular em geral, propondo a horizontalidade no saber, uma formação plena (contra a fragmentação do conhecimento), e pela produção de conhecimento para a classes trabalhadoras e pela transformação social;

– A universidade popular deve constituir-se pelo o povo e para o povo, objetivando a transformação social para a emancipação humana.

Táticas:

– Constituição de um Grupo de Trabalho Nacional sobre Universidade Popular no intuito de dar continuidade a esta construção. Ele será composto inicialmente pelos mesmos convocantes do 1° SENUP, buscando agregar mais organizações e manterá o método consensual de trabalho e organização;

– Constituir e fortalecer na base do movimento grupos de trabalho pela universidade popular;

– Construção de agenda mínima nacional para articulação da luta pela Universidade Popular;

– Construção de um 2° Seminário Nacional de Universidade Popular.

Ciência e Tecnologia

A universidade vem se transformando profundamente com sua associação ao setor produtivo. Esse é um processo que se inicia na fase de industrialização brasileira, se desenvolve com o advento do capitalismo monopolista no Brasil, fase na qual também se consolida. Antes, a academia era uma instituição pequena e auto-referenciada, voltada à formação de profissionais liberais e de quadros para a burocracia estatal. A produção, por sua vez, era desenvolvida pelo senso prático de alguns indivíduos, pela intuição e pelo empirismo. A organização do saber tecno-científico e sua associação à produção gerou um processo inesgotável de renovação e transformação da base material da sociedade, no que se convencionou chamar de sociedade industrial. A universidade cumpriu um papel decisivo nesse processo, e, para isso, colocou-se a serviço da inovação tecnológica. Nas faculdades e universidades nas sociedades pré-capitalistas, o conhecimento era restrito pelo baixo nível de desenvolvimento das forças produtivas. Após a industrialização, o conhecimento passou a ser restrito por direitos de propriedade intelectual e tornou-se altamente cobiçado por ser instrumental e necessário no processo reprodutivo do capital e de expansão do mercado.

Com o desenvolvimento capitalista, o conhecimento se tornou muito dinâmico. Os países centrais colocaram a produção de conhecimento (e, assim, as universidades) como pilares de seu projeto de desenvolvimento, criando e aprofundando uma estratificação internacional de conhecimento. Nesse novo cenário, as elites passaram a respaldar sua condição de elite não só na riqueza ou no Estado, mas também em uma pretensa superioridade intelectual. A universidade, controlada por esse segmento social, passou a ser o núcleo de certificação do conhecimento válido, o que serviu para deslegitimar saberes populares, indígenas, orais, religiosos e comunitários. Ao mesmo tempo em que consolidava o cânone científico como hegemônico, a universidade pôs a ciência e a tecnologia como mecanismos de acumulação privada de riqueza e reprodução da ordem existente. Ela não só se voltou à criação de novos direitos de propriedade intelectual, mas também forjou um ambiente ideológico que legitima essa como sua função única e ideal.

Dessa forma, a produção de conhecimento revela a universidade como uma instituição social e ideologicamente conservadora. Por trás das inovações, dos títulos e das patentes, revela-se o profundo comprometimento com o mundo atual e a silenciosa renúncia em transformá-lo.

Por isso, a questão diz respeito à orientação programática para a ciência. A difusão de uma ideologia tecnocrática criou a ilusão de que a solução dos problemas da humanidade viria exclusivamente por meio do avanço da ciência e da tecnologia produtiva. Esta ilusão surge da orientação ideológica que atua no sentido de desviar o foco de intervenção humana do plano da estrutura social de classes. O ofuscamento, ou completa exclusão da dimensão social, leva a uma orientação da problemática social ao âmbito da “gestão” e da “responsabilidade individual”, inclusive a administração ganha um caráter “científico” e, por assim dizer, “neutro” e “autojustificado”. Na verdade, a própria expansão produtiva por meio da ciência é inseparável da conformidade ideológica com certos parâmetros de “avanço social” impostos justamente por quem se beneficia deles. Por isso mesmo, no campo da luta pela universidade popular, nos interessa a ligação entre o conhecimento produzido e transmitido nas instituições de ensino superior com os interesses e as necessidades das massas populares e dos trabalhadores. Assim, um dos papéis fundamentais da luta pela universidade popular é revitalizar o papel intelectual crítico e criador dentro da universidade atual, rompendo com os parâmetros da educação que tem o mercado como condição e o lucro como fim.

Defendemos:

– Lutar contra a privatização do ensino e a reprodução da ciência e tecnologia voltada aos interesses do capital;

– Atender as demandas populares através da Ciência e Tecnologia;

– Lutar pelo financiamento público no desenvolvimento da ciência e tecnologia, contrapondo ao financiamento privado que condiciona os fins da pesquisa à mera demanda do mercado;

– Controle popular sobre a produção cientifica e tecnológica e a socialização do conhecimento.

Táticas:

– Criação de um Grupo de Trabalho de Ciência e Tecnologia articulado ao GT-Nacional;

– Articulação com movimentos sociais para disputa do direcionamento da ciência e tecnologia produzida na universidade;

– Debater a influência das Fundações “ditas” de Apoio no condicionamento privatista da produção de ciência e tecnologia;

– Questionar e discutir as políticas científicas.

Autonomia e Democracia

A luta por uma Universidade Popular terá o grande desafio de construir as mediações democráticas para a organização coletiva de nosso povo na gerência do trabalho social produzido no espaço universitário. Para tanto, os mesmos produtores do trabalho social (e da ciência) devem ter autonomia sobre seu trabalho, não sendo determinados por outra força (o lucro, por exemplo).

Hoje encontramos as universidades com poucos espaços abertos para a discussão, para a interferência dos setores progressistas da sociedade como um todo, para a livre escolha de dirigentes pela comunidade universitária e para o exercício da transparência democrática nos processos de construção de planos políticos pedagógicos bem como nas definições sobre a pesquisa e a extensão, entre outros. Nessas condições é praticamente impossível avançar em um projeto de Universidade Popular. Autonomia e democracia são imprescindíveis.

No Brasil, a universidade é criada dentro da ordem burguesa e desenvolve-se com as transformações requeridas pela “modernização conservadora”, que extirpou os elementos progressistas na ditadura civil militar de 1964. Com a redemocratização “lenta, gradual, segura e consentida” referendada pela Constituição de 1988, ela é permanentemente requerida pela lógica de mercado. As reformas do período FHC-Lula fortaleceram o setor privado de ensino superior, bem como a penetração de empresas privadas nas universidades públicas.

É evidente que o movimento universitário tem ficado na defensiva: na luta contra a “reforma universitária” e suas medidas “fatiadas” implantadas nos últimos anos. Em todos os casos, além das muitas dificuldades de apresentarmos e reivindicarmos os nossos projetos por uma universidade crítica, criadora e popular, temos que reconhecer que fomos implacavelmente derrotados. A ausência de democracia interna e autonomia de gestão universitária foram constantes nesse período.

Se aprovar toda uma contra-reforma universitária de uma só vez no primeiro governo de Lula poderia gerar mais problemas, o recurso às medidas provisórias, decretos e aprovação de leis, sem o necessário debate nas universidades, foi implantado. Projetos do início do Governo Lula já estão consolidados. E notem que a proposta mais avançada da dita “reforma” – o fim da escolha dos reitores pelo presidente da república (lista tríplice) inserindo eleições diretas e não mais “consultas públicas” – não só ficou na promessa como parece já estar esquecida.

Em vários momentos os conselhos decisórios, mesmo com a vantagem numérica de dirigentes indicados, foram palcos de referendamento das políticas governamentais para as universidades. Foi assim na aceitação do programa REUNI, firmada com força policial e o deslocamento das reuniões previamente indicadas para locais mais afastados; na tentativa de aprovação de Parques Tecnológicos, sem consulta à comunidade universitária; nos inúmeros processos com expulsões e multas a estudantes que ocuparam, protestaram e reivindicaram os seus direitos nos últimos 8 anos, entre outras medidas. Ou seja, a “autonomia” que o Estado garante às universidades é apenas para a captação de recursos junto à iniciativa privada e cobrança de “serviços” (taxas e mensalidades), privatizando o destino e a função do conhecimento produzido.

Diante desse quadro conjuntural, muitas das reivindicações dessa temática serão fundamentos para uma Universidade Popular, pois indicam as possibilidades democráticas e progressistas da inserção de movimentos sociais ignorados pela universidade. Por isso, é necessário “romper os muros” e inserir movimentos sociais, populares, sindicais e demais estudantes no contexto geral da disputa pelos rumos da universidade brasileira.

Defendemos:

– A democracia interna nas universidades para ser efetiva, não pode ser simplesmente formal, mas tem como condição a existência de um movimento organizado identificado com as causas populares;

– Autonomia das Instituições de Ensino Superior (IES) ao Estado e ao mercado. Pelo financiamento estatal integral;

– Lutar pela estatização ou reestatização das universidades privadas e/ou pagas. Pela completa gratuidade do ensino superior;

– Que as Fundações “ditas” de Apoio impedem a autonomia plena das IES perante ao mercado. Sua lógica é privatizante e portanto lutaremos pelo fim delas;

– Resistir às políticas do MEC que ferem com a autonomia das IES (REUNI, “pacote da autonomia”, Lei de Inovação Tecnológica, etc);

– Criar mecanismos para o controle social dos recursos da sociedade;

– Abrir espaços para inserção dos movimentos sociais contra-hegemônicos organizados na disputa dos rumos da universidade popular.

Táticas:

– Luta pelos 10% do PIB para a educação pública;

– Construir campanhas por democracia interna, como pela paridade nos colegiados e escolha de dirigentes, avaliando as condições específicas para a luta pelo voto universal;

– Pelo fim da lista tríplice e o artigo da LDB que estipula o voto dos professores em 70%;

– Por mais concursos públicos para docentes e técnico-administrativos efetivos;

– Nas universidades pagas lutaremos pelo congelamento ou rebaixamento das mensalidades;

– Contra o Projeto de Lei 7.639/10 das “universidades comunitárias” a ser aprovado no Congresso Federal;

– Lutar pela liberdade de organização sindical e estudantil em todas universidades, em especial para as IES privadas e pagas;

– Contra qualquer forma de criminalização dos estudantes e trabalhadores que se organizam e lutam por seus direitos.

Formação Profissional e Educação Popular

Em uma compreensão mais ampla, nossa formação enquanto seres humanos abrange todos os espaços de nossa vida em sociedade. Em uma sociedade onde a lógica do capital hegemoniza a produção e a reprodução da vida social, as instituições educacionais e culturais e os meios de comunicação seguem, em sua maioria, os ditames desta lógica. Necessitam garantir o consenso de que os interesses de acumulação das classes dominantes são interesses gerais de toda a sociedade.

No contexto universitário, este enquadramento fica cada vez mais explícito com a crescente dissociação entre o ensino, a pesquisa e a extensão e a busca por submeter estes elementos da formação à lógica privada. Conforme a universidade orienta-se para o mercado, limita cada vez mais o protagonismo e a autonomia da comunidade universitária para a construção de um processo de formação criador e voltado para as necessidades humanas.

Nas universidades particulares e centros de ensino superior privados, a busca pelo perfil mais adequado ao mercado se tornou uma obsessão, criando uma subserviência quase religiosa em relação aos desígnios e vontades do mercado, na busca por “qualificar” a mão-de-obra. Muitos professores de universidades públicas e privadas utilizam a expressão “mercado” para se referir ao que espera o estudante do lado de fora da universidade. Soma-se a essa lógica a massificação de bacharelados “genéricos” com salas superlotadas e a expansão do ensino à distância puro ou mesclado com ensino presencial.

A fragmentação do conhecimento evidencia-se quando vemos cursos de exatas e/ou tecnológicos com uma lógica bastante tecnicista, onde a intervenção na realidade deve limitar-se a execução e reprodução do que já veio pronto “de cima”, e nos cursos de humanas, uma tendência ao crescimento de um tipo de formação “academicista”, individual e desconexa de uma inter-relação com os anseios de transformação da realidade. A separação entre “bacharelados” e “licenciaturas” também fortalece essa lógica de fragmentação do conhecimento e adequação à lógica do mercado. Tudo isso força, nos diferentes campos de aprendizado, a legitimação material e ideológica do poder dominante.

No entanto, a tendência de privatização e precarização do saber não se impõem de maneira absoluta, pois sempre encontra resistência nos setores mais avançados da comunidade universitária que defendem o caráter público e democrático do ensino e a necessidade de um conhecimento crítico e criador.

A construção de uma formação oposta à lógica dominante exige não só o apetite pelo conhecimento, mas também a ânsia por transformação, colocando o conhecimento como um bem social e coletivo e não uma aquisição individual, fazendo com que o aprender, o fazer e o ensinar sejam partes inseparáveis de um todo.

Defendemos:

– Contrapor ao tecnicismo e a fragmentação do conhecimento uma educação integral, plural e voltada à emancipação e desenvolvimento das capacidades humanas;

– Trabalhar a multidisciplinaridade e interdisciplinaridade na construção da universidade popular.

Táticas:

– Ampliar os debates para outros níveis de ensino realizando a discussão sobre educação popular;

– Disputa dos currículos dos cursos pela ótica da Universidade Popular;

– Luta contra fragmentação dos cursos em bacharelados e licenciaturas.

Acesso e Permanência

É impossível pensar a luta pela Universidade Popular, como estratégia de luta a longo prazo que visualiza a constituição de uma nova universidade dentro de uma sociedade que objetiva a superação das desigualdades sociais, se não tivermos no horizonte a destruição da universidade elitista. Portanto, nesta luta necessariamente teremos o horizonte de universalização do ensino superior público, gratuito e de qualidade, com a abertura da universidade para as camadas populares de forma massiva.

Entretanto, precisamos estar atentos para o fato de que nem toda massificação do acesso significa uma real democratização ou popularização da universidade, muito embora a democratização efetiva necessariamente exija massificação do acesso. Em outras palavras, uma ampliação de vagas que não aumenta os investimentos públicos – pelo contrário, os diminui – levando a um sucateamento da infra-estrutura e a uma intensificação do trabalho docente, com conseqüente diminuição da qualidade; que incentiva a privatização interna das universidades públicas e um crescimento exponencial das instituições privadas; que apresenta o ensino à distância em substituição ao ensino presencial não representa uma real democratização. Nessas condições, temos um aumento da evasão e das vagas ociosas, bem como uma divisão desigual entre “centros de ensino” (escolões de terceiro grau, ou ensino pós-médio) e “centros de excelência”. A popularização e democratização real da universidade exige excelência para todos, uma equiparação da qualidade e não a competição entre as instituições; exige políticas amplas de permanência para combater as vagas ociosas e a evasão, dando condições plenas para a formação de indivíduos críticos.

O entendimento da educação enquanto um direito de fato, exige a condição de igualdade substantiva e não meramente formal.

Defendemos:

– Fim dos processos seletivos para instituições educacionais e pela universalização do ensino superior público e gratuito;

– É dever do Estado garantir totalmente a permanência do estudante na universidade.

Táticas:

– Lutar pela manutenção e ampliação dos direitos estudantis como: bolsas, casa do estudante, creche, alimentação, acessibilidade, condições de ensino, cultura e lazer, passe livre e outros;

– Lutar para democratizar a gestão das políticas de permanência nas instituições;

– Transferência dos bolsistas do PROUNI para as universidades federais;

– Lutar por políticas públicas que garantam reserva de vagas para estudantes de escolas públicas em todas as universidades públicas;

– Estimular a criação de cursinhos populares;

– Fim da cobrança de taxas para o vestibular;

– Preservar a conquista das políticas de cotas étnico-raciais nas universidades. Lutar por cotas para deficientes físicos;

– Tornar público todos os equipamentos de infra-estrutura destinados a permanência que ainda permaneçam sob o comando da iniciativa privada;

– Lutar por desenhos universais e atendimento às necessidades especiais de cada sujeito de modo a garantir tanto o acesso quanto a permanência de todas as pessoas na universidade. Fazer campanhas de conscientização e discussão que abordem o tema;

– Elaborar e socializar estudos sobre a situação e perfil dos estudantes das universidades;

Função social da universidade: pra que (m)?

A universidade brasileira, desde a sua implementação, vem cumprindo um papel importante na sociedade, configurando-se no espaço de desenvolvimento de ciência e tecnologia. Só que para tal análise da universidade, necessitamos também analisá-la em sua dinâmica complexa com a sociedade. Para tanto, a ciência e tecnologia e suas aplicações práticas dependem, de modo decisivo, do regime social, das forças que dominam essa determinada sociedade, dos interesses a que o desenvolvimento social está subordinado: em síntese, ao regime de classes em permanente luta. Mas também, assim como os antagonismos existentes na sociedade, a universidade também assim se revela.

Utilizando-se de bandeiras históricas do Movimento Universitário, os últimos governos provocaram algumas mudanças que poderiam iludir os mais desavisados. O REUNI, enquanto cartada do projeto da contra-reforma universitária, trouxe a tona a requerida expansão das vagas nas universidades públicas e a mudança dos padrões pedagógicos. Eivada das condições atuais de desenvolvimento do capitalismo, trouxe fragmentação quando prometia “grandes áreas”, precarização e sucateamento das vagas pela ausência de investimento quando prometia expansão. Além disso, trouxe diferenciação e desigualdades evidentes com a perspectiva de centros de ensino e centros de excelência.

No plano ideológico, a universidade é reflexo de uma sociedade individualista e competitiva, moldada a partir dos interesses dominantes, oriundos hegemonicamente dos países centrais. Para tanto, as lutas sociais emancipatórias necessitam cada vez mais de uma unidade histórica para propor alternativas à essa visão hegemônica.

Da universidade, temos as categorias dos técnicos, professores, e estudantes constituindo o Movimento Universitário. Aliado a esses, a necessidade de todos os movimentos sociais das classes trabalhadoras de disputar o espaço da universidade. Já que, em muitos movimentos sociais (do campo e da cidade) existentes, pauta-se a transformação da sociedade, o povo deverá estar preparado para superar tudo que foi imposto pelo sistema capitalista: desde as relações de produção na sociedade até a produção de ciência e tecnologia (orientada assim, por outro ideal, outra lógica de construção de todo o conhecimento) que são pontos que estão intimamente ligados – a produção de tecnologia está orientada também pela forma de exploração dos meios de produção e da força de trabalho disponível.

A universidade não mudará somente de dentro para fora e nem somente de fora pra dentro devido à forte influência do sistema vigente da sociedade. Emancipar a produção de ciência e tecnologia, alterando essa ideologia segregadora é o grande desafio. As experiências no campo da pesquisa emancipadora (geralmente ligada aos movimentos sociais mais fortes), na extensão (como canal de formulação e ligação com as demandas populares) e no ensino que busque construir conhecimento crítico, são as expressões mais presentes de ações locais e singulares de uma idealizada universidade popular. Por isso, é fundamental superar a fragmentação das ações universitárias do tripé, integrando todas e pensando nela como a totalidade de um mesmo ser, em que cada uma, não deixando de fazer as ligações, podem contribuir para essa totalidade.

Na busca por uma universidade pública, de qualidade, democrática, crítica, criadora e popular, vê-se um caminho estratégico que aponta um horizonte de transformação, não só da universidade, mas de toda a sociedade.

Defendemos:

– Que a universidade contribua para a formação de pessoas que produzam conhecimento na perspectiva da classe trabalhadora;

– Ampliar a luta pela universidade popular, buscando envolver outras forças sociais como protagonistas na construção do projeto de Universidade Popular;

– Indissociabilidade do tripé ensino-pesquisa-extensão nas universidades;

– Verba pública para educação publica.

Táticas:

– Mapear, articular e fortalecer os projetos e grupos de Extensão Popular que agem como uma das ferramentas para a construção da Universidade Popular, contribuindo para que tenham mais expressão política e popular;

– Campanha pelo fim do analfabetismo no Brasil;

– Articular com os movimentos sociais para lutar por reformas que democratizem a sociedade, exemplo: reforma agrária, reforma Urbana, etc;

– Fomentar discussão de educação popular no ensino fundamental e médio, nos grupos locais e estaduais;

– Construção dos Estágios Interdisciplinares de Vivência – EIV’s.

1 Os textos que introduzem os pontos “A Universidade hoje e a Universidade Popular”, “Ciência e Tecnologia”, “Autonomia e Democracia”, “Formação Profissional e Educação Popular” e “Função Social da Universidade: pra que (m)?” foram tirados da Cartilha Preparatória, com pequenos ajustes, e já representam um acúmulo e um consenso construído antes mesmo do Seminário em si. O texto que introduz o ponto “Acesso e Permanência” foi proposto pela Comissão de Sistematização do 1° SENUP e representa uma discussão feita durante o próprio Seminário, seja nas mesas os Grupos de Discussão (GD´s). Todos os eixos que seguem os textos foram aprovados por consenso em todos os GD´s e na Plenária Final do evento.