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O “novo” Novo Ensino Médio em pauta: é hora de retomar a luta!
A contrarreforma do Ensino Médio, implementada em 2017 sob o governo de Michel Temer e prevista para ser aplicada gradualmente até 2020, prometia flexibilizar o ensino básico e adaptar a grade curricular à realidade dos estudantes. No entanto, o chamado Novo Ensino Médio (NEM) representou, na prática, a implementação de princípios neoliberais na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), privilegiando disciplinas como empreendedorismo em detrimento de matérias essenciais como história e geografia. Além disso, o modelo não dialoga com o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), que segue sendo a principal porta de entrada para as universidades públicas. Como consequência, estudantes das escolas públicas ficaram ainda mais desfavorecidos, sem acesso adequado às disciplinas fundamentais para a preparação para o vestibular.
Impactos do desmonte do ensino médio
O modelo adotado no Brasil foi justificado com base no sistema educacional dos Estados Unidos, onde o ensino é estruturado para atender a aptidões e profissões vinculadas ao mercado de trabalho, especialmente ao setor terciário da economia (comércio e serviços). Esse é justamente o setor que emprega a maioria dos trabalhadores brasileiros – um setor, no entanto, altamente precarizado, marcado pela terceirização, destruição da CLT e quase inexistência de direitos trabalhistas ou progressão de carreira. A reforma do ensino médio reflete, assim, o avanço do neoliberalismo, que não apenas ataca os trabalhadores, mas também seus filhos e filhas, limitando suas perspectivas educacionais e profissionais.
Além da redução da carga horária, especialmente nas áreas de ciências humanas, os professores concursados passaram a ser deslocados para fora de suas áreas de formação ou obrigados a lecionar em múltiplas escolas para cumprir suas horas. A reforma, portanto, não apenas prejudicou a formação crítica dos estudantes e comprometeu seu futuro, mas também impactou negativamente os docentes cujas disciplinas foram desvalorizadas ou eliminadas.
Na estrutura do NEM, apenas 60% da carga horária dos três anos do ensino médio (cerca de 1800 horas) era destinada às disciplinas básicas – como matemática, português, geografia, biologia, química, física, história, filosofia, artes, sociologia e língua estrangeira. Os 40% restantes (1200 horas) eram ocupados por conteúdos alinhados à reforma, como empreendedorismo e inteligência emocional, esvaziando ainda mais a formação dos estudantes.
Apesar da eleição de Lula em 2022 e da pressão do movimento estudantil, o NEM não foi revogado, mas sofreu alterações em 2025. Entre as mudanças, destacam-se:
- A ampliação da carga horária das disciplinas básicas para 2400 horas, reduzindo para 600 horas o espaço das disciplinas acrescentadas pela BNCC;
- A retomada das 300 horas obrigatórias de ensino comum nos cursos técnicos;
- O veto ao ensino à distância no ensino médio;
- A reativação do Ensino para Jovens e Adultos (EJA) e do ensino médio noturno, considerando a realidade de jovens que trabalham e ainda buscam concluir sua formação.
Embora essas mudanças sejam resultado direto da mobilização estudantil e da pressão popular sobre o governo, ainda são insuficientes para reverter os danos causados pela reforma.
Como reflexo do NEM, nos últimos cinco anos, a taxa de evasão escolar atingiu seu maior índice em décadas, tendo seu auge em 2023 e mantendo um crescimento preocupante de cerca de 6% ao ano, segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Medidas como o programa Pé-de-Meia, que propõe uma poupança estudantil, ainda não cobrem os custos básicos para que os jovens permaneçam na escola (como transporte e material didático) e não foram suficientes para conter a evasão. O resultado desse retrocesso educacional é o afastamento de milhares de jovens da escola e sua inserção precoce em empregos precarizados para complementar a renda familiar.
O que dizer da direção da UBES frente ao NEM?
Apesar de, em um primeiro momento, ter defendido a revogação do NEM, a União Brasileira de Estudantes Secundaristas (UBES) tem adotado uma postura recuada diante do novo projeto. Isso fica evidente pelo fato de a entidade ter se limitado a aceitar a adequação de alguns pontos, em vez de mobilizar as bases secundaristas para avançar na luta pela revogação. Além disso, a UBES tem demonstrado uma postura dócil em relação ao governo federal, comprometendo sua independência de classe e atribuindo a culpa exclusivamente ao “Congresso reacionário”.
O governo federal, por sua vez, tem se mostrado pouco disposto a construir um novo modelo de educação em conjunto e em diálogo com o movimento estudantil. Enquanto isso, o MEC tem aprofundado sua submissão a think tanks liberais, como Todos Pela Educação e a Fundação Lemann, que representam os interesses da burguesia na formulação das políticas educacionais. Essa postura de rendição do governo federal a organizações burguesas, assim como o afastamento das entidades estudantis do debate, passa longe do radar da crítica da UBES.
Que caminho devemos trilhar agora?
Para reverter esse cenário, é fundamental que as organizações estudantis intensifiquem campanhas contra o NEM. A mobilização deve partir das bases, com a criação e fortalecimento de grêmios estudantis que assumam a linha de frente dessa luta. Além disso, os sindicatos dos professores do ensino básico devem se engajar nessas campanhas, exigindo um ensino público de qualidade, salários dignos e infraestrutura adequada nas escolas.
Não podemos limitar nossa luta apenas à revogação do Novo Ensino Médio, pois o modelo anterior também não atendia plenamente às necessidades da classe trabalhadora. É fundamental avançar na construção de um novo projeto de escola. A Escola Popular que defendemos é um projeto que rompe com a lógica mercantilizada da educação, garantindo um ensino verdadeiramente público, gratuito e voltado para as necessidades da classe trabalhadora. Para isso, propomos uma escola que não apenas universalize o acesso à educação, mas que também assegure uma formação integral, científica e crítica, vinculada ao desenvolvimento social e produtivo do povo. Defendemos um sistema escolar onde estudantes e trabalhadores da educação tenham protagonismo na gestão, planejamento orçamentário e curricular, garantindo um ensino democrático, laico e comprometido com a transformação social.
Nosso projeto de Escola Popular não se limita à estruturação curricular, mas busca transformar a escola em um espaço vivo de organização comunitária e luta política. Acreditamos que a escola deve ser um centro cultural e social dos bairros proletários, onde a comunidade possa participar ativamente das decisões educacionais e utilizar o espaço para encontros, debates e atividades coletivas. Além disso, defendemos uma educação omnilateral e politécnica, que não apenas prepare para o mundo do trabalho, mas que compreenda o trabalho como parte da formação humana, promovendo o pleno desenvolvimento das novas gerações de trabalhadores. Nossa luta por uma escola popular está diretamente vinculada à construção de uma sociedade socialista, onde a educação não seja um privilégio, mas um direito fundamental e instrumento de emancipação da classe trabalhadora.
Somente com amplas mobilizações e com a construção do Poder Popular será possível derrubar essa reforma antipopular e conquistar uma educação verdadeiramente emancipadora.
PELO FIM DO NOVO ENSINO MÉDIO!
PELO FIM DO VESTIBULAR!
POR UMA ESCOLA POPULAR!
Coordenação Nacional da UJC
9 de fevereiro de 2024