Migração e Refúgio: O papel dos comunistas na Solidariedade Internacional
por UJC RJ — Núcleo ZS
Migrar é um direito exercido historicamente pela humanidade que foi cerceado pelo Estado Burguês com políticas chauvinistas.
Nós comunistas entendemos que a migração é um direito e as experiências de Estados socialistas trataram o tema com seriedade e humanidade.
Hoje, as fronteiras seguem fechadas e militarizadas em todo o mundo, e torna a migração um processo burocrático complexo e insensível à história e às necessidades das pessoas.
O refugiado é a pessoa que sofre risco ou perseguição em seu país de origem, e tem fundado temor pela sua segurança caso retorne ou permaneça no território daquele país.
Os países do centro capitalista são os autores das condições que geram a necessidade do refúgio na periferia do mundo.
Apesar disso, muitos países negam a entrada dessas pessoas, ou as deportam
Não há mundo livre enquanto houver o imperialismo!
A Lei de Migração (Nº 13.445/2017) do Brasil foi formulada em 2014 e apresenta avanços em relação aos direitos dos migrantes e os deveres do Estado Brasileiro
Porém denunciamos o desmonte e sucateamento das instituições públicas que tratam da temática, promovido pelo governo Bolsonaro. Demissões em massa no CONARE, o Conselho Nacional para Refugiados e cortes orçamentários sistemáticos a Casa Rui, organização que atende diretamente os Refugiados, localizada em Humaitá, no Rio de Janeiro. Bolsonaro anunciou a saída do Brasil do Pacto Global para uma Migração Segura, Ordenada e Regular.
A migração é um fenômeno social que se estabelece a partir da necessidade de produção e acumulação de capital e está relacionada ao processo do próprio desenvolvimento do capitalismo. O surgimento das máquinas alterou a dinâmica produtiva no campo e na cidade e não apenas agravou a concentração de capital em determinados centros, mas expropriou terras e forçou a classe trabalhadora a mover-se em busca de trabalho assalariado. Esse movimento representa uma mudança necessária para a sobrevivência humana e também possibilitou a precarização das condições de trabalho e a oferta de baixos salários.
Esse cenário se reproduz também em âmbito internacional, a partir do momento que há o processo imperialista de exploração e condicionamento dependente dos países da periferia do mundo. A desindustrialização, as sanções econômicas, os boicotes e os monopólios dos grandes conglomerados empresariais retiram a capacidade produtiva e o poder econômico dos países, levando assim também, a capacidade de propiciar segurança e os direitos básicos da população local. Nesse cenário vulnerável, a população foge ao ter a sua sobrevivência ameaçada por conflitos, invasões ou pela instabilidade econômica e social.
Trabalhadores em busca da sua sobrevivência se mudam entre campo e cidade, entre regiões e países diferentes. A permanência e a mobilidade estão relacionadas à capacidade do trabalhador de vender a sua força de trabalho e do valor atribuído ao seu trabalho naquela conjuntura social e econômica, assim como a garantia do acesso aos direitos básicos para a vida digna. Este fenômeno não é exclusivo de momentos históricos como a Revolução Industrial, mas se repete tal como as crises do capitalismo são cíclicas, atingindo diferentes setores sociais e econômicos. Migrar é sobretudo um direito exercido historicamente pela humanidade que se viu cerceado com o agravamento da institucionalidade do Estado Burguês a partir de políticas chauvinistas, estabelecendo o não nacional como ameaça aos seus interesses [1].
A chegada daqueles considerados indesejáveis aumenta a carga de responsabilidade social do Estado, forçando o Estado a enfrentar os interesses de acumulação de capital da burguesia visto que a classe trabalhadora aumenta ainda mais seu contingente e suas demandas, e muda a balança do poder político com a vinda de uma comunidade com identidade, cultura e demandas potencialmente distintas daquelas já dominantes. O sujeito migrante na grande maioria das vezes é o sujeito vulnerável às condições sociais e econômicas do seu local e tempo, e que não possui alternativas para permanecer dignamente no seu lugar de origem. São trabalhadoras e trabalhadores que pertencem a grupos sociais marginalizados e que no novo ambiente se marginalizam novamente, ocupando zonas periféricas e sofrendo discriminação por sua condição de estrangeiro e trabalhador, quando não por outras características como raça, religião e idioma. Não somente, em outro aspecto é preciso lembrar políticas migratórias racistas fazem parte da nossa história, vide o incentivo da vinda de imigrantes italianos, alemães e japoneses pelo governo imperial brasileiro, e também durante a república, em detrimento da mão de obra escravizada negra e indígena que fora liberta e marginalizada, num processo de tráfico humano que durou séculos [2].
Nós comunistas entendemos que a migração deve ser respeitada enquanto direito e, historicamente, são as experiências de Estados socialistas as mais avançadas ao tratar o tema com seriedade e humanidade. Na URSS, por exemplo, para que se solicitasse a cidadania soviética plena bastava ser trabalhador, do campo ou da indústria, adquirindo o direito a plena participação dos sovietes e de voto [3]. Além disso, a solidariedade internacional é marca dos países socialistas, manifestando-se, dentre outra maneiras, através do intercâmbio científico entre estudantes e trabalhadores que transferiam conhecimento e partilhavam a sua cultura em programas internacionais entre Alemanha Oriental, Cuba, Coreia Popular, China, URSS, Vietnã etc. A União Soviética criou a Universidade da Amizade dos Povos com esta finalidade, recebendo milhares de estudantes vindos de países alinhados ou não com o governo soviético com bolsas de estudo [4]. Além disso, a URSS teve um papel fundamental em apoiar os interesses anticoloniais e emancipatórios defendidos pelos países da Ásia e África, com suporte político e financeiro em diversos meios e espaços de deliberação multilateral e outras organizações internacionais, o que é fundamental para que os países consigam a autossuficiência e a capacidade de garantir o bem estar dos seus povos [5].
O internacionalismo é um dos pilares do Movimento Comunista, e não enxerga fronteiras no seu plano de amizade e prosperidade para os povos. O agravamento das contradições do capitalismo fez com que o nacionalismo ganhasse características de forma a antagonizar com o internacionalismo, na Revolução Industrial quando trouxe a ideia de competição entre os países, e no início do século XX com o chauvinismo, que despertou expressões fascistas após a Primeira Guerra Mundial, em uma guerra inter-imperialista [6]. competição inibe a cooperação internacional para o alcance de objetivos comuns entre todos os povos, até mesmos consensos como a existência dos direitos humanos partilhados entre todos. O nacionalismo pode ser um componente a contribuir com o internacionalismo quando se fundamenta na solidariedade e na legitimidade de um outro povo, da sua história, cultura e mito fundacional, ignorando a lógica competitiva e predatória da hierarquização dos povos a estabelecer hegemonia. Assim se dá o internacionalismo socialista, quando povos reconhecem a importância da luta anti-imperialista e se aliam para o estabelecimento da hegemonia proletária, para que possam ter finalmente a sua liberdade. Assim, entende-se a importância do acolhimento e da proteção dos povos que migram a fugir da opressão sofrida por seu país de origem, tantas vezes motivada pelo imperialismo. Muitas vezes os migrantes, vítimas desse processo, não enxergam as raízes dos problemas sociais vividos no país de origem, podendo expressar àquilo que a mídia burguesa (e imperialista) diz sobre os acontecimentos. É nossa tarefa investigar rigorosamente e fazer a crítica a partir dos fatos e da verdade, de forma a contribuir com a emancipação da classe trabalhadora internacionalmente.
Hoje, as fronteiras seguem fechadas e militarizadas em todo o mundo, o que torna a migração um processo burocrático complexo, violento e insensível à história e às necessidades das pessoas.
A migração é um fenômeno tipificado pelo Direito Internacional, havendo uma série de direitos e deveres a se cumprir por parte do Estado e dos indivíduos [7]. Alguns dos documentos centrais nesse debate é o Estatuto do Refugiado, das Nações Unidas de 1961 e para o contexto americano, a Carta de Cartagena de 1984. Veja-se: existem mais de 80 milhões de pessoas deslocadas contra a vontade no mundo, o que já representa 1% da população mundial [8]. Porém a institucionalidade burguesa não garantiu o direito da população migrante, que segue sofrendo descaso e tendo os seus direitos desrespeitados. Todos nós trabalhadores e trabalhadores devemos nos conscientizar sobre as condições de migrantes e refugiados e devemos ser solidários, organizarmos a nossa classe e estabelecer o Poder Popular. Só o povo solidário com o povo poderá garantir o tratamento justo, digno e solidário aos migrantes e refugiados.
O Refúgio é um tipo específico de migração. O refugiado é a pessoa que sofre perseguição em seu país de origem, e tem fundado temor pela sua segurança caso retorne ou permaneça no território daquela país. Este temor pode ser motivado por raça, religião, etnia, gênero, convicções políticas, conflitos armados e o generalizado desrespeito pelos direitos humanos. Além disso, para ser reconhecido como refugiado, o Estado destino deve entender que o Estado de origem perdeu a capacidade de proteger a dignidade e a vida daquela pessoa ou grupo de pessoas [9]. Apesar disso, muitos países negam a entrada dessas pessoas, ou as deportam para outros países. Um Estado não pode negar a acolhida a um refugiado, não pode discriminá-lo, não pode devolvê-lo ao Estado de origem e tem o dever de proporcionar o acesso aos serviços básicos e necessários para uma vida digna [10]. É importante denunciar, ainda, o que motiva a migração e o refúgio.
Além das condições precárias trazidas pelas contradições do sistema capitalista e da hierarquização das relações entre os países, é necessário dizer que os países do centro capitalista são os autores criminosos de tais condições na periferia do mundo. Em busca de petróleo e o acesso a outros recursos e posições militares estratégicas os Estados Unidos e os seus parceiros da OTAN invadem, bombardeiam e vitimam milhões de vidas de forma indiscriminada, principalmente no Oriente Médio. Além disso, estes mesmos países sabotam e promovem bloqueios e sanções econômicas que geram instabilidade social, a miséria e conflitos generalizados. Como vimos, fatores que geram a necessidade de migrar [11].
Migrantes, apátridas, refugiados e traficados enfrentam inúmeros desafios para integrar-se à sua nova comunidade, além de passarem por um processo migratório extremamente perigoso que expõe os migrantes a alta vulnerabilidade. Não é incomum o aliciamento de menores, o estupro, o tráfico de pessoas e a separação familiar: existem milhares de menores que enfrentam a migração desacompanhados, à revelia e desprotegidos. Além disto, ao chegarem ao país-destino, os documentos que foram confiscados pelo Estado de origem ou perdidos ou destruídos dificultam em muito a vida dos refugiados. Mesmo quando o Estado de origem colabora para a obtenção desses documentos, ainda existem processos burocráticos como a regulamentação profissional, reconhecimento de diplomas, análise de currículo escolar e a decisão da série na matrícula que são processos inclusive taxados, e claro, traduções e a barreira idiomática [12]. Das crianças refugiadas, apenas 50% tem acesso ao Ensino Fundamental de alguma forma, e dos jovens, apenas 22% tem acesso ao Ensino Médio. A pauta da internacionalização das universidades não apenas é importante para o enriquecimento cultural e intercâmbio científico, mas também facilita que migrantes e refugiados tenham acesso à educação [13].
A Lei de Migração (Nº 13.445/2017) do Brasil foi formulada em 2014 e sancionada em 2017, com vetos feitos pelo então presidente golpista Michel Temer [14]. Mesmo com os vetos, a Lei apresenta avanços em relação aos direitos dos migrantes e os deveres do Estado Brasileiro. Porém, denunciamos o desmonte e sucateamento das organizações públicas que tratam da temática, promovidas pelo governo Bolsonaro. Demissões em massa no CONARE, o Conselho Nacional para Refugiados e cortes orçamentários sistemáticos a Casa Rui, organização que atende diretamente os Refugiados, localizada em Humaitá, no Rio de Janeiro [15]. Além disso, o Governo Bolsonaro anunciou a saída do Brasil do Pacto Global para uma Migração Segura, Ordenada e Regular, o que demonstra o desinteresse e o descaso do Brasil na cooperação internacional em busca da garantia dos direitos dos migrantes e refugiados [16].
É nossa tarefa, enquanto comunistas, defender os direitos da população oprimida e marginalizada. Conhecer o fenômeno social da migração e a motivação imperialista por trás dele é a chave para que possamos construir um mundo fraterno e justo, onde todos nos reconheçamos companheiros de classe! Lutemos por acabar com os fatores e estruturas que forçam as pessoas a migrar. Não há mundo livre enquanto houver o imperialismo!
Referências
[1] VENDRAMINI, Célia Regina. Migration from a Dialectical and Historical Materialist perspective. Revista Katálysis, [S.L.], v. 21, n. 2, p. 239-260, maio 2018. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/1982-02592018v21n2p239
[2] SEYFERTH, G.. Colonização, imigração e a questão racial no Brasil. Revista USP, São Paulo, v. 53, p. 117-149, 2002.
[3] Конституция СССР 1924 г. – http://constitution.garant.ru/history/ussr-rsfsr/1924/
[4] https://br.rbth.com/sociedade/2015/10/02/uma-universidade-na-base-da-amizade_478907
[6] ANDERSON, Perry. Internacionalismo: Um breviário. Anos 90, Porto Alegre, v. 12, n. 21/22, p.5-25, mar. 2005.
[7] Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados – https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Convencao_relativa_ao_Estatuto_dos_Refugiados.pdf
[8] https://www.acnur.org/portugues/dados-sobre-refugio/
[9] Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados – https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Convencao_relativa_ao_Estatuto_dos_Refugiados.pdf
[10] Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados – https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Convencao_relativa_ao_Estatuto_dos_Refugiados.pdf
[11] BARROSO, Juliana Lyra Viggiano. Segurança e uso da força no contexto da OTAN pós-Guerra Fria. Revista de Sociologia e Política, [S.L.], n. 27, p. 43-63, nov. 2006. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s0104-44782006000200005
[12] http://dapp.fgv.br/revalidacao-e-reconhecimento-de-diplomas-no-brasil-uma-via-crucis-perto-fim/
[13] JUBILUT, Liliana Lyra; LOPES, Rachel de Oliveira; GARCEZ, Gabriela Soldano; FERNANDES, Ananda Pórpora; SILVA, João Carlos Jarochinski. Direitos Humanos e Vulnerabilidade e a Agenda 2030. Boa Vista: Ufrr, 2020. 854 p.
[14] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2017/Lei/L13445.htm
[16] https://istoe.com.br/futuro-chanceler-diz-que-brasil-vai-deixar-pacto-global-de-migracao/