A máquina de morte do Ceará continua ceifando vidas negras
Há 10 dias atrás, uma vida periférica foi interrompida dia 19, durante uma abordagem policial. Na noite de domingo houve uma ocorrência na Barra do Ceará, um adolescente de 16 anos foi assassinado pela Polícia Militar. Segundo testemunhas, o jovem estava acompanhado de seus amigos quando houve a abordagem e os disparos foram efetuados pela polícia. Em vídeos é possível ver a brutalidade dos agentes de segurança, quando ameaçam os moradores próximos, inclusive efetuando disparos para cima, a fim de dispersar a população.
Essa vida perdida é mais uma das vítimas de um sistema que oprime as pessoas negras e periféricas. Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 6.430 pessoas tiveram suas vidas interrompidas pelas mãos das forças de segurança do Estado, de janeiro a dezembro do ano passado (2022). Esse número nos mostra que houveram um total de 17 vítimas por dia. Dentre estas, 83% eram pessoas negras e 45% eram jovens (18 a 24 anos). Esses dados nos evidenciam mais ainda a brutalidade policial no nosso cotidiano.
Em documento produzido pelo Coletivo Negro Minervino de Oliveira, que reúne militantes e amigos do PCB na luta contra o racismo e o genocídio da população negra, é afirmado que:
“São negros e negras a maior parte das pessoas confinadas em presídios e em instituições que, em vez de possibilitar a recuperação e o desenvolvimento da condição humana, encarceram crianças e adolescentes, assim como aqueles que engrossam diariamente as estatísticas de assassinatos cometidos nas favelas e periferias, configurando um cenário catastrófico de abandono e genocídio vivido pelo povo negro em nossa sociedade”.
Diante deste quadro, o Coletivo aponta que “a única alternativa eficaz para o enfrentamento do racismo passa pela identificação e denúncia do sistema de relações sociais no qual se reproduz a opressão da população negra brasileira”. A luta pela conquista da igualdade racial não se faz dissociada das lutas anticapitalistas, mas é preciso avançar no combate ao racismo, denunciando sem tréguas a violência e o genocídio cometidos contra a população negra.
A luta anticapitalista não pode se dissociar da luta antirracista. A repressão vivida no cotidiano faz parte do sistema de dominação burguês, o Estado, é seu modus operandi, através do braço armado do estado: a Polícia. Tão necessário quanto derrubar o estado burguês é extinguir seu braço armado tal como ele se apresenta e tal processo, realizando-se como um processo de emancipação dos sujeitos, significa também redenção ao policial e ao policiado. Abolir a polícia é, portanto, a abolição tanto do repressor, quanto do reprimido. Esta é a premissa básica para a possibilidade de construção da consciência de classe de um agente de um aparelho repressivo do Estado
A extinção do braço armado do Estado não é, porém, um processo instantâneo, uma declaração ou um decreto de fim da autoridade. É, na verdade, resultado de um complexo processo de luta contra hegemônica que esvazie de sentido a necessidade de uma força policial enquanto instância mediadora da vida social, deslegitimando assim a própria ordem social burguesa. Deste modo, a abolição da polícia tem mais sentido se considerada como um desvanecimento terminal da autoridade policial, parte do desvanecimento terminal do próprio Estado e da ordem social burguesa, etapas fundamentais para a construção da ação revolucionária e para a tomada do poder. No Brasil, diversos movimentos impõem ao Estado a restrição da atividade policial e um controle externo das atividades mais rígido, a ADPF das Favelas caminha neste sentido, quando um conjunto de organizações ligadas ao movimento negro e aos movimentos de favela do Rio conseguiram a partir de articulações no congresso nacional e no judiciário a restrição das operações policiais nas favelas cariocas durante a vigência da quarentena no Estado, o que diminuiu significativamente a letalidade policial nos meses seguintes. Ao redor de todo o mundo surgem pesquisas e iniciativas populares que denunciam o aumento do vigilantismo e da militarização da vida social. Até mesmo a luta pela desmilitarização das polícias no Brasil é uma trincheira legítima na luta pelo desvanecimento do Estado, desde que seja construída sobre um programa anticapitalista e revolucionário.
É papel das organizações anticapitalistas se engajarem nestes movimentos, qualificando as propostas antiautoritárias com o horizonte político revolucionário e contribuindo a partir da tradição marxista-leninista para a organização e ampliação destes movimentos até que se tornem de massas. Quanto às organizações policiais que se colocam contra a militarização e o estado de guerra imposto pelas polícias, é necessário se colocar à disposição do conjunto das forças populares, integrar-se a elas e compartilhar sínteses no sentido da superação da ordem social vigente, sendo esta a forma suprema da luta contra a violência e a opressão de todos os tipos.
Coordenação Regional da UJC Ceará
30 de novembro de 2023