A destruição da ciência e tecnologia no Brasil e a necessidade de um projeto de educação popular e socialista.
Por: Jones Manoel*
Desde a independência brasileira emerge a compreensão em diversos pensadores críticos e movimento dos trabalhadores de que o nosso país, assim como a totalidade da América Latina, não é verdadeiramente livre e soberano. O colonialismo clássico dos portugueses foi substituído pelo neocolonialismo inglês, primeiramente, e depois, o estadunidense. As formas de capitalismo desenvolvidas em nossa América, diferentemente das revoluções burguesas clássicas (como a Revolução Francesa), não geraram formas democráticas e um impulso à criação da soberania nacional. Pelo contrário, o capitalismo se desenvolve no Brasil conciliando o interesse das antigas classes dominantes, especialmente o latifúndio, com as novas (como industriais, banqueiros e grandes comerciantes) em associação com o imperialismo. Essa forma particular de capitalismo, o capitalismo dependente, mantém a subordinação do país aos centros do imperialismo e condiciona a nossa estrutura econômica e a produção de riqueza aos interesses dos grandes monopólios mundiais.
Um dos grandes exemplos da dependência econômica, como característica marcante do capitalismo dependente, é a debilidade da produção de nossa ciência e tecnologia. Como país dependente, produzimos principalmente produtos primários (como soja, carne de gado, laranja etc.) e quando temos plantas industriais ativas, como as montadoras de carro, os componentes mais complexos, como microeletrônica e robótica, são basicamente importadas (compradas fora). Os países centrais do capitalismo, como Estados Unidos e Alemanha, lutam para manter um firme monopólio da ciência e tecnologia que não é e não pode ser universal e cosmopolita no capitalismo.
Durante os anos de desenvolvimentismo, especialmente nos períodos do Governo Vargas, houve tentativas de estruturar uma ciência e tecnologia de bases nacionais que reduzisse a dependência da economia frente ao imperialismo, contudo, esse projeto não obteve sucesso porque a burguesia industrial, a classe que Getúlio Vargas representava por excelência, não tinha e continua não tendo hoje qualquer projeto de construção de uma efetiva soberania nacional. Os grandes representantes da classe dominante, como FIESP, FIRJAN, Febraban, Abimaq, CNI e CNA (entidades que juntas representam a indústria, latifúndio, os bancos e instituições financeiras) não só não apresentam qualquer projeto nacional de ciência, como apoiam todas as iniciativas em curso para destruir o pouco construído no século XX – como a destruição da Petrobras, uma grande empresa produtora de ciência, e os cortes no ministério de ciência e tecnologia.
O orçamento da ciência e tecnologia para 2017 era de cinco bilhões, mas o Governo Temer só liberou 3,3 bilhões. Esses cortes paralisaram centenas de pesquisas, destruíram outras e impedem qualquer avanço significativo do Brasil (somos um dos países que menos registra patentes no mundo). Para 2018, o corte no orçamento da ciência e tecnologia é de quase 30%. Chama atenção como esses cortes não causam qualquer comoção social devido ao distanciamento dos cientistas e centros de pesquisa das necessidades reais da classe trabalhadora, servindo, basicamente, como instrumentos para o lucro do capital – contudo, para o atual projeto em curso de aprofundamento da dependência e do subdesenvolvimento não é necessário o mínimo de produção nacional científica e, portanto, tudo pode ser destruído.
Uma das consequências desse desmonte da ciência no país é que em 2015 quase 50 mil pesquisadores (49.735) deixaram o país por ausência de condições mínimas para continuar seus trabalhos – esses pesquisadores, é claro, não tem como destino países de África, mas os Estados Unidos e Europa Ocidental, reforçando o monopólio dos centros do capitalismo na produção tecnológica. Cabe aos comunistas lutar contra o processo de aprofundamento da dependência e destruição do nosso parque de pesquisa científica. Essa luta tem algumas premissas.
Primeiro, a elite do nosso país não tem e não pode ter qualquer projeto de produção nacional de ciência e tecnologia. Sócia menor do imperialismo, a classe dominante defende o atual estado de coisas. Segundo, a produção científica não pode servir como um instrumento para valorização do capital com instituições de pesquisa distantes dos problemas fundamentais do povo trabalhador e pesquisadores achando que a “sua” ciência é apolítica. Nesse sentido, faz-se necessário combinar as formas de resistência aos cortes e a defesa de mais financiamento com uma luta por outro projeto de educação e ciência, um projeto de uma educação popular que vise produzir conhecimento com e para a classe trabalhadora buscando dar respostas às suas necessidades objetivas servindo como mediação na estratégia de construção do socialismo.
Só com uma perspectiva estratégica renovada e ligada aos interesses e lutas das classes populares é que a problemática da produção de ciência e tecnologia poderá ser devidamente enfrentada no país no processo de construção socialista superando a dependência e o subdesenvolvimento. Nesse enfrentamento, desde já, é necessário ficar claro que a classe dominante em seus mais diversos setores, nada tem a contribuir, mas são adversários a serem derrotados.
*Mestrando em Serviço Social pela UFPE e militante da UJC-Brasil