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Quem são os rebeldes sírios?
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Quem são os rebeldes sírios?

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por Óscar Valadares*

Um modo dos melhores que haja para compreender um conflito, notadamente quanto mais complexo for, é revisar quem é que participa, quem combate, quem mata. Sem se deixar ir de mãos dadas com os preconceitos e muito menos com os grandes conglomerados de comunicação, uma análise deste tipo costuma pôr em claro, por uma parte, que um conflito do tipo do que se vive na Síria não é entre bons e maus, mas entre interesses contrapostos e, por outra, que, consequentemente, sempre há involucradas mais partes das que se nos diz. O ataque directo de Israel sobre Damasco evidencia isso, e aponta para uma demonstração de que o que o anti-imperialismo internacional sustinha é certo: que na Síria o combate não é de guerra civil, mas outra cousa bem distinta.

No relato que nos contam, a guerra da Síria é um conflito em que uns rebeldes —sem aclarar muito bem quem são na realidade— se opõem a um governo de tipo autoritário no cenário complexíssimo das denominadas primaveras árabes. Assim narrado, não dista muito daquelas já históricas concentrações da praça Tahrir do Cairo que derrubaram o governo de Hosni Mubarak e levaram o Egito —sempre nesse relato— para uma nova era de paz e prosperidade. A única diferença iria residir na especial resistência do governo sírio e na sua capacidade para enfrentar a pressão cidadã, propriciando por essa via o estabelecimento de uma fase bélica em que o exército, comandado polo próprio presidente Bashar al-Asad se opõe a um novo ente militar e rebelde que luta por algum tipo de ideal superior. Partido da base de que dos «rebeldes» apenas sabemos que são isso —rebeldes—, há cousas que neste relato não só não concordam, como também são, por pura lógica, incongruentes. Por sinal, sirva uma só e incómoda pergunta: se alguém nos diz que os «rebeldes» são pouco mais do que cidadãos revoltados contra o autoritarismo de al-Assad, de onde saem as armas com que combatem? A realidade, que tem pouco a ver com esta teoria maniqueia do bem contra o mal, é bem mais complexa (e móbil), como iremos ver.

Um conglomerado opositor inverossímil

Comecemos por dizer que, com efeito, existe uma oposição síria contra o governo do presidente al-Assad, que essa oposição é variada e responde a diferentes interesses e que amiúde tem trabalhado descoordenadamente, quando não de forma claramente contraditória. Como é evidente também, essa oposição, tão heterogénea até em questões fundamentais, não combate por si própria, nem se decide por si própria avançar por uma via armada ao ponto de quebrar o país, nem tira as armas das árvores ou de baixo das pedras.

Não existe, e até é improvável que venha existir, um órgão de coordenação de toda a oposição armada. Existe, sim, uma Coalizão Nacional Síria da Oposição e das Forças Revolucionárias (CNSOFR), mas esta coalizão não inclui as diferentes forças mujahidin, cuja crescente presença na guerra é deliberadamente ocultada pola imprensa internacional contrária ao Estado sírio.

A Coalizão Nacional Síria da Oposição e das Forças Revolucionárias, como se tem autodenominado o órgão de coordenação da variada oposição não-mujahid, é reconhecida formalmente pola NATO como o legítimo governo sírio (ainda sem ter sido eleito nem sequer nesse sistema de simulacro democrático que denominam «eleições»), seguindo o mesmo padrão de comportamento que seguiu em Líbia com os opositores armados contra o governo Gaddafi. Mas a guerra na Síria também não é uma guerra entre o governo e esta Coalizão Nacional Síria e os mujahidin. Não é uma guerra entre seguidores de al-Assad e seguidores de Mustafá Sabbagh, o secretário-geral da CNSOFR. Sob nenhuma hipótese. Não há mais do que olhar para o seu perfil ou para o facto, altamente significativo, de residir em Arábia Saudita, não na Síria, e ser uma figura, a priori, politicamente independente, sem grande relevância até ao momento na oposição ao governo al-Assad. Sabbagh não lidera nada, e não é necessário ter especiais conhecimentos de política para o compreender. Tampouco parece que George Sabra, o presidente do CNSOFR, possa exercer qualquer liderança certa, por vários motivos, entre eles, ser cristão no meio a uma oposição em grande parte construída arredor da ideia de um novo Estado sírio teocrático, organizado em função da lei islâmica.

Ao mesmo tempo, como dissemos, a Coalizão é constituída por uma agregação de partes muito heterogénea. A grandes traços, fazem parte dela o Exército Livre Sírio e a Frente de Libertação Islámica Síria, que como tal frente inclui mais de vinte organizações diferentes. Ao mesmo tempo, há que somar a presença dos mujahidin, isto é, literalmente, «os que lutam pola jihad», que pola sua vez se dividem em três blocos também divergentes entre si: a frente al-Nusra, a Frente Síria Islâmica, e a organização Ghuraba al-Sham. Fora da Coalizão há também apoiantes dentro do país, como fora: basicamente Arábia Saudita, Qatar, Israel e Turquia. Vejamos o que representa e quer cada uma das partes:

O Exército Livre Sírio

O Exército Livre Sírio (ELS), que é o nome mais lido e ouvido em Ocidente como quase sinónimo dos «rebeldes», é uma organização militar, configurada com desertores (uns 18.000, aproximadamente) do exército regular da Síria, enfrentados com o governo e que, segundo os seus diferentes porta-vozes, procura apenas a queda do governo de al-Assad, sem perseguir qualquer fim político concreto. Esta afirmação, que por si própria se revela contraditória —especialmente à luz do envolvimento imperialista na região—, serviu à mídia internacional para espalhar a ideia de que o levante contra o governo persegue apenas uma espécie de democratização do país, sem outros interesses. E, porém, o ELS foi uma das ramas opositoras que mais claramente aderiu À CNSOFR, desde o seu início, formalizando assim as suas ligações com os jihadistas com que esta Coalizão partilha objetivos imediatos. Aos efeitos da propaganda, o ELS passa por ser a rama militar do movimento opositor, o qual também não é correcto, considerando que a oposição é um fenómeno bem mais difuso, e que todos os grupos estão a participar na guerra com todas as consequências. O ELS, contudo, não está formado apenas por militares sírios que desertaram, mas por um número indefinido —porém, significativo segundo todas as fontes— de mercenários vindos não só de países limítrofes ou na região, como também veterano da guerra da Croácia, da guerra da Bósnia, da guerra do Iraque, da Líbia, da Tunísia e do Egito, cujos salários “superiores a 2000 $ USA por dia são pagados por ricos doadores estrangeiros”, segundo informações de primeira mão do general croata Marinko Krešić. Outras fontes falam também do envolvimento secreto de membros do Exército de Libertação de Kosovo, o que se viu confirmado há uns meses pola morte —convenientemente silenciada— de um desses combatentes na fronteira síria-turca.

Ao mesmo tempo, o relacionamento do ELS com o resto de forças opositoras ocasionou um importante transvase de efetivos de organizações pró-sharia para aquele exército, motivado em grande medida polo acesso do ELS ao armamento de guerra. A entrada destas novas milícias radicalizou as tácticas de guerra do ELS, que asinha se viu envolvido em ataques com bombas suicidas que foram duramente condenados pola própria direção do ELS, uma de cujas razões para desertar do exército regular tinha sido o uso da força militar contra população civil. Os ataques jihadistas contra objetivos aleatórios e indiscriminados causaram —e causam, na medida em que não deixaram de se produzir— uma importante crise entre o ELS e o resto da oposição. Mas, mesmo assim, o ELS não abandonou a Coalizão, mas ao contrário. O resultado é que, em algumas zonas do país, o ELS e as forças paramilitares da Frente al-Nusra se vigilam mutuamente e praticam entre si operações de inteligência e contra-inteligência que demonstram a extrema volatilidade e a inverossimilhança da própria Coalizão opositora. Tanto assim que entrevistas a combatentes do ELS expuseram a crença geral de que, se a oposição ganhar a guerra contra o Estado sírio, imediatamente se abriria uma nova fase de guerra, desta vez entre o ELS e os paramilitares jihadistas. Por outras palavras, que se a oposição vencer a guerra, o resultado será outra guerra. Mesmo assim, a situação não é clara, se tivermos em conta o grau de infiltração no ELS do extremismo jihadista, verificável em declarações de alguns mandos intermeios e superiores do próprio Exército Livre Sírio a propósito de o objetivo da guerra ser o derrubamento do governo segrar e a imposição de um regime islamista. E, como dado, a começos deste mês de maio, um informe aponta para um volume de deserções de combatentes do ELS por volta do 25%, que posteriormente ingressa na frente al-Nusra, o que permite concluir que, quer o ELS não difere substancialmente do resto de grupos armados jihadistas nos seus objetivos, quer o comando do ELS está a perder o controlo ideológico da sua própria força a um ritmo vertiginoso.

A Frente Síria de Libertação Islâmica

A Frente Síria de Libertação Islâmica Síria (FLIS), cujo nome aparece na imprensa occidental convenientemente encurtado como Frente de Libertação Síria, é outro dos piares fundamentais da Coalizão opositora. Trata-se, na realidade, de mais uma organização guarda-chuva que inclui por volta de 20 grupos islamistas que juntam vários milhares de militantes armados ao longo e largo de todo o país, misturando-se com o ELS em várias áreas. Fazem parte da FLIS grupos paramilitares com presença em áreas muito localizadas do território, constituídos ao efeito ou procedentes de outras organizações guarda-chuva, como a brigada Suquor al-Sham (Idlib, procedente do ELS), a brigada Farouq (Homs), a Liwa al-Islam (Damasco), a brigada Amr Ibn al-Aas e a brigada Tawhid (Aleppo), etc. Todas elas têm em comum apenas o facto de serem organizações locais e não pertencerem a outras organizações de âmbito superior, como o ELS ou a frente al-Nusra, com as que em ocasiões, porém, se solapam. No caso da FLIS, polo momento parece impossível determinar com rigor em que grau a Frente controla os grupos locais.

Do que não há dúvida é do seu alto nível de heterogeneidade interna, além da constante islamista. No seu interior convivem grupos de inspiração salafita, outros vinculados com os Irmãos Muçulmanos, e, em geral, agrupações mais ou menos extremistas e mais ou menos ligadas com outros braços armados mujahidin, desde al-Nusra até à Frente Islâmica Síria. Ademais, entre si, estas organizações apresentam relações complexas, como por exemplo a brigada Tawhid em Aleppo, que na realidade é uma sub-unidade de combate da brigada Farouq de Homs. Todo isto é o que faz do FLIS um dos agentes mais instáveis e mais imprevisíveis nesta guerra, e também constitui um dos pontos de esgoto das responsabilidades polos crimes de guerra cometidos, na medida em que torna quase impossível rastejar os acontecimentos e julgar os culpáveis.

A frente al-Nusra

A frente al-Nusra é a principal das ramas opositoras mujahidin, e um dos agentes fundamentais de todo o conglomerado «rebelde», com entre 6.000 e 10.000 militantes armados. Constituída em janeiro de 2012, com a guerra já iniciada, esta frente paramilitar e fundamentalista sunita remonta, na realidade, ao momento em que o jihadismo começa a se autoorganizar na Síria. Com um crescimento exponencial desde o início da guerra, completado em grande medida a base das deserções do ELS, como vimos, al-Nusra passa por ser o braço mais agresivo das forças paramilitares da oposição. O que é claro é que a frente al-Nusra não é, em nenhum caso, uma força explicável do ponto de vista sírio, mas um caso evidente do poder de al-Qaeda na região. Não é por acaso que o líder do Estado Islâmico do Iraque —uma organização guarda-chuva do jihadismo no Iraque—, Abu Bakr al-Baghdadi, tenha declarado há só umas semanas que al-Nusra é o braço de al-Qaeda na Síria.

Os motivos da frente al-Nusra para se opor ao Estado sírio partem da sua concepção pan-islamista da região e do ideal de restauração do Califato Islâmico. Daí que tenha sido declarada organização terrorista polos Estados Unidos em dezembro passado. Esta declaração e a própria oposição do jihadismo a receber ajuda militar ocidental têm sido apontadas como motivos do receio da NATO a participar abertamente na guerra contra o governo de Bashar al-Assad, enquanto reconhece a Coalizão opositora como governo legítimo do país.

Evidentemente, a existência desta frente e as suas relações com a Coalizão são sistematicamente ocultadas pola imprensa ocidental na medida em que constituem uma seção incómoda e difícil de explicar e inserir no relato da guerra tal e como ele é construído propagandisticamente. Isto é assim não só fora, como também no interior do país, onde as tácticas extremas do jihadismo têm produzido importantes fendas entre o conglomerado opositor, sempre mal resoltas em função do inimigo que partilham. Daí declarações como as do porta-voz do ELS em Aleppo, ao dizer “não compartimos os objetivos de Jabhat al-Nusra, mas enfrentamos o mesmo inimigo”, que evidenciam o medo do ELS a perder a ajuda do imperialismo norte-americano e europeu e também de importantes setores da população, que rechaçam a imposição da lei da sharia que al-Nusra prevê levar em frente de forma imediata no pós-guerra.

Mesmo assim, o curso dos acontecimentos e o retrocesso «rebelde» das últimas semanas têm levado a Coalizão opositora a defender a frente al-Nusra entre a população síria e a pedir aos Estados Unidos para retirarem a consideração de «organização terrorista» a al-Nusra, com o objetivo de assegurar o fluxo de armamento que procede tanto de Ocidente como dos seus aliados no Golfo Pérsico.

A Frente Islâmica Síria (Ahrar al-Sham)

A Frente Islâmica Síria é outro dos principais grupos mujahidin. Com uma arquitetura interna similar à Frente Síria de Libertação Islâmica, a FIS constitui uma organização guarda-chuva salafista formada por onze grupos paramilitares entre os quais Ahrar al-Sham, a brigada al-Haqq, Ansar al-Sham ou o Movimento Islâmico al-Fajr. Em janeiro de 2013, a maioria destes grupos decidiram fusionar-se numa única organização, denominada Harakat Ahrar al-Sham al-Islamiyya (Movimento Islâmico de Ahrar al-Sham), porém mantendo uma estrutura frentista. Aos efeitos práticos, a Frente Islâmica Síria antes e agora Ahrar al-Sham passam por ser a organização pró-sharia da Síria, a diferença da Frente al-Nusra, de procedência iraquiana. Daí que a sua ideologia seja o salafismo e o seu objetivo a instauração de um estado teocrático regido pola lei islâmica.

Forças curdas opositoras?

Estão as forças curdas a cooperar com os opositores sírios e os jihadistas? Segundo o relato ocidental do que acontece na Síria, é assim: as Unidades de Proteção Popular (YPG, polas suas siglas curdas) seriam mais uma rama do conglomerado armado de oposição ao «regime de al-Assad». A realidade, por enquanto, não é exatamente essa. Ao contrário, o povo curdo que mora no norte do território do Estado sírio tem-se declarado em repetidas ocasiões em contra do conflito armado, e especificamente contra a intervenção estrangeira. O 22 de junho de 2012, no marco da sua luta nacional pola soberania, o povo curdo na Síria tomou os edifícios administrativos sírios no Curdistão Oeste (norte da Síria) e declarou a sua própria administração democrática.

Isto, que foi lido polos meios internacionais favoráveis aos «rebeldes» como mais um levante contra al-Assad, foi na realidade uma operação de reclamação soberana na linha histórica do povo curdo, não só em Síria, como também no Iraque ou na Turquia. Daí que o Curdistão se manifeste como agente não-alinhado no conflito sírio, e só procure o estabelecimento de um novo status que o reconheça como sujeito político. Daí também que as YPG tenham como único objetivo proteger a população curda do exército regular sírio, das bandas armadas «rebeldes» e das incursões do exército turco na fronteira, que procuram impedir o desenvolvimento de uma autonomia de facto nessa área ainda sob controlo sírio de iure. Existe, então, uma força opositora curda? Existe. Mas não é uma força pró-islamita nem uma força alimentada polo imperialismo. Ao contrário: é uma força soberanista, cujo único interesse é o autogoverno e a consecução do novo status político necessário — uns interesses que pouco têm a ver com os da CNSOFR, com os do jihadismo e, muito menos, com os da NATO.

Forças de combate estrangeiras

Finalmente, há que considerar a existência sobre o terreno de forças estrangeiras de oposição. Se deixarmos à margem por um momento o papel fundamental dos Estados Unidos e de alguns países da UE, notadamente o Reino Unido e a França, encontramos na guerra, disparando os fuzis, conduzindo os carros blindados ou recebendo o fogo inimigo, não só há sírios e sírias. Os países vizinhos estão a ter uma presença certa, ao ponto de expandir o conflito numa guerra por procuração (proxy war) regional, entre Estados sunitas (Turquía, Arábia Saudita, Qatar), que apoiam a oposição, e Estados alawitas (Irã, Iraque e Líbano), que apoiam o governo. O mapa da situação necessitaria mostrar as ligações desses Estados sunitas com o imperialismo ocidental, notadamente com os EUA, Israel e determinados países da UE, como França, o Reino Unido e, secundariamente, Alemanha — o que na prática significa uma ligação direta com a NATO.

O papel da NATO, da que também faz parte a Turquia, resulta, por isso, de especial importância. Embora as declarações de novembro de 2011 em que a NATO anunciava não ter intenção de participar sobre o terreno na guerra síria, o certo é que o envolvimento da Aliança é evidente. Não só porque alguns países membros tenham formalizado um perverso grupo internacional de amigos da Síria (Syrian Support Group) cujo objetivo é financiar a oposição, equipá-la (alegadamente, com armamento não letal) e pular pola entrada da «comunidade internacional» na guerra de forma aberta, como também porque alguns desses países estão já a participar de forma alargada sobre o terreno.

Assim, em junho de 2012, a agência Reuters apontava para a presença de forças especiais britânicas em território sírio, trabalhando em colaboração com a oposição em tarefas de guerra. Ademais, tem-se conhecimento de que tanto a CIA como o BND alemão monitoram informações depois transferidas ao Exército Livre Sírio e, daí, ao resto da oposição do CNSOFR. No mesmo sentido, a Turquia tem já protagonizado uma série de ataques na fronteira norte da Síria, envolvendo também o povo curdo entre as vitimas. Trata-se de ataques intermitentes, a finais de 2011 e meados de 2012, e de baixa intensidade. Mesmo assim, a participação da Turquia não se limita a estes incidentes, e colabora também nas tarefas de armamento e transferência de combatentes em território sírio e curdo. Ainda, como membro da NATO, Turquia está a exercer pressão sobre a Aliança para invadir a Síria como operação de defesa, e até ao momento já conseguiu que mísseis alemães e neerlandeses fossem enviados à Turquia e ativados. O mesmo papel fornecedor estão a adoptar a Arábia Saudita e Qatar, assim como o novo poder instaurado na Líbia após a morte de Gaddafi. Isto significa o envio de jihadistas, armamento pesado, e importantes quantidades de dinheiro. Quanto ao Iraque, o apoio à oposição provém de al-Qaeda e também de organizações próximas, como Ghuraba al-Sham, que inicialmente estava formada por jihadistas sírios que tinham participado na guerra do Iraque e que ficaram no país após a saída das tropas norteamericanas, e que agora estão a regressar à Síria e a colaborar estreitamente com a outra organização jihadista iraquiana: al-Nusra.

Finalmente, a semana passada também Israel se destapou como potência militar ativa no conflito. A sua participação é muito anterior, evidentemente, como um dos agentes mais interessados em terminar com o governo sírio e em expandir o conflito para o Líbano e para o Irã, mas o seu recente ataque aéreo contra Damasco tornou já evidente para quem quiser ver que a situação está mais perto de explodir do que de arrefecer. Sem dúvida, a retórica sionista que gastam os meios israelenses e os seus lobbies de pressão nos EUA e na UE são em grande medida responsáveis por esta situação.

A única conclusão possível

A única conclusão possível, à luz de todo o exposto, é bem simples e resume-se em apenas uma frase, mesmo que seja gravíssima: na Síria não há uma guerra civil. O que na Síria haja terá mais a ver com uma guerra por procuração, uma guerra de interesses, tanto políticos como económicos (com a olhada posta no controlo petrolífero da zona e no relacionamento da Síria com o Irã), onde os países centrais do sistema aparentam ficar à margem e onde toda a teatralização propagandística entra em cena convenientemente amplificada pola imprensa e as diferentes maquinarias de propaganda.

Dito por outras palavras: não existem os rebeldes ou, em todo caso, quem combate já não são os rebeldes, mas os mercenários — salvo o caso curdo, talvez. O apoio de Ocidente ao ELS e as suas reservas a respeito dos grupos mujahidin apoiados por al-Qaeda, assim como a perspectiva de uma próxima guerra entre o ELS e o extremismo islamista são razões mais do que suficientes para temer um alargamento do conflito tanto no espaço como no tempo. Quem seja que está a ganhar com este jogo imperialista é algo que também devemos considerar para qualquer conclusão que quisermos tirar.

* Óscar Valadares é militante sindical e membro de Mar de Lumes — Comité Galego de Solidariedade Internacionalista.

Fonte: http://contrapoder.info/quem-sao-os-rebeldes-sirios/