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Jamais esquecer das heroínas e heróis antifascistas de 2020!
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Jamais esquecer das heroínas e heróis antifascistas de 2020!

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por Leonardo Silvestrin*

fotografia por Raíssa Oliveira

Frente às vitórias políticas que estamos vendo acontecerem em uma série de países das Américas, muitas pessoas lamentam que o povo brasileiro “não resiste”, “não luta”, “não se mobiliza pelos seus direitos”. Isso, seguramente, não é verdade. O Brasil não tem um povo passivo. Tem um povo massacrado pela rotina de trabalho, obrigado a se arriscar para sobreviver em ônibus lotados mesmo em uma pandemia; censurado, enjaulado, torturado e assassinado pela repressão policial e judicial; e anestesiado pela mídia empresarial, que finge indignação com a psicopatia do presidente ilegítimo, mas que se recusa a apoiar sua deposição, desde que o mesmo “se domestique” e siga tocando a agenda podre de retirada de direitos, que tanto excita “nossa” elite.

Do outro lado, entre os que dizem representar a nossa classe trabalhadora, há uma burocracia sindical e partidária corrompida pelo peleguismo, a décadas acovardada. Está presa em suas ilusões a respeito de um desenvolvimento pacífico e igualitário dentro do capitalismo, que tem a violência e a desigualdade no seu DNA. Nessa tentativa de conciliação, as pessoas exploradas e oprimidas do nosso país seguem sendo sufocadas.

Mas apesar de tudo isso, no ano de 2020 vimos uma série de revoltas no nosso país contra o assassinato das pessoas negras pelo regime reacionário brasileiro, seja pelas mãos de agentes do Estado, seja pelas mãos de agentes das empresas privadas. Vimos greves e paralisações de petroleiros, carteiros, trabalhadores da saúde, dos entregadores de aplicativo, de trabalhadores do telemarketing, de professores da iniciativa pública e privada e de muitas outras parcelas da classe trabalhadora, que travam suas lutas cotidianas à despeito do silenciamento da mídia empresarial.

Dentro desse panteão de heroínas e heróis anônimos do nosso povo, faço questão de lembrar de um grupo em específico: a militância antifascista que, em meio a uma pandemia, colocou sua própria vida em risco e foi às ruas enfrentar os bandos bolsonaristas em maio de 2020.

Quando Bolsonaro participou, em 19 de abril desse ano, de um ato em frente ao Quartel-General do Exército do Distrito Federal que tinha como pauta a sua consagração como ditador, a ameaça de um golpe de Estado parecia ser um perigo iminente. Todo domingo, os golpistas organizavam suas manifestações, saiam em carreatas com seus luxuosos carros até os quartéis de suas cidades, para levantarem enfim sua bandeira maldita: “Intervenção Militar já, com Bolsonaro presidente!”. Em Porto Alegre, no mesmo dia do ato em Brasília, os bolsonaristas Paulo Miguel Rempel e José dos Santos Martins, conforme informação divulgada pela Zero Hora e pela Revista Fórum, agrediram com soco no rosto e pontapés uma mulher vestida de vermelho, quando ela e seu camarada ousaram passar em frente à manifestação antidemocrática.

Desde a chegada da pandemia em março, não havia mais manifestações da esquerda. Em contrapartida, a carta assinada por 20 governadores contra as bravatas fascistas do presidente, as “notas de repúdio” do Congresso e STF, a oposição da Globo e outros monopólios da mídia, tudo isso parecia mais causar riso entre os fanáticos de Bolsonaro do que qualquer recuo. Para muitos, era a correlação de forças ideal: “Bolsonaro é o antissistema, os corruptos e o establishment o odeiam. É a hora de deflagrar um novo 1964, para limpar de vez o Brasil dos bandidos, dos comunistas, da esquerda, das feministas, dos globalistas, das aberrações gayzistas, para enfim varrermos toda a corja que impede que o Brasil seja grande de novo!”.

Eis que veio o dia 3 de maio. Aquele dia, ao chegarem na região central da cidade que sedia o Comando Militar do Sul, os bolsonaristas de Porto Alegre tiveram uma surpresa ao ver que não estavam mais sozinhos. Mas não eram as massas que vieram ao seu apoio, tampouco os soldados do quartel que ouviram seu chamado. Eram dezenas de militantes vestidos de preto, imbuídos do mais justo ódio contra a ditadura, contra o genocídio, contra o fascismo, unidos sob um único grito: “FORA BOLSONARO!”.

Enfurecida, a extrema-direita vai embora, mas sem antes entrar em um embate com os antifascistas. Os que vestem preto lembram a impunidade do dia 19 de abril, lembram da impunidade de 21 anos de regime militar, vivem a impunidade diária de três décadas de “democracia” liberal. Lançam seus socos. Se a violência é a única linguagem que entendem os ditadores, então talvez falando sua língua eles nos entendam.

De domingo em domingo, o grupo de antifascistas em frente ao CMS foi aumentando. Em união pela liberdade, as torcidas antifascistas do Grêmio e do Internacional, junto a grupos anarquistas, comunistas, socialistas e social-democratas, impedem que as hordas se criem. No dia 24 de maio, uma corrente humana interrompe as carreatas pró-Bolsonaro antes que elas cheguem ao Comando Militar do Sul. A massa, unida, em um só grito: “Recua, fascista, recua! É o poder popular que tá na rua!”. E, pela primeira vez, os fascistas obedecem.

Humilhados, os bolsonaristas vão embora, escoltados pela Brigada Militar (cujos agentes presentes, conforme relatos, não lhes demonstravam muita simpatia). Eles, uma dezena, talvez duas ou até três. Nós, nas ruas, dezenas, centenas, depois milhares, em Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Recife, Distrito Federal. Pelas janelas, observando atentamente e torcendo, éramos milhões.

Desmascarada, a realidade forçou a extrema-direita a aceitar que ela não era a “silenciosa maioria” que aspirava ser. Era ela mesmo, afinal, a escória do Brasil, o mais repugnante resultado do golpismo elitista de 2016, que definitivamente consolidou a posição do nosso país na lista dos mais deploráveis regimes dos nossos tempos.

No dia 1º de junho, o capitão dá a ordem: “já que eles marcaram para domingo, deixa domingo lá”. Era hora de bater em retirada. O novo golpe havia sido derrotado – pelo menos, por enquanto. Desmoralizados e sem o apoio das ruas, alguns dos agentes mais extremistas do bolsonarismo foram presos e exilados, à mando das facções do regime que não querem viver sob a bota de Bolsonaro. Dando tapinhas em suas próprias costas, os “democratas” do STF e do Congresso não reconheceram que, se houve um princípio de investida institucional contra o fascismo, isso só foi possível porque os antifascistas mostraram sua disposição de doar até mesmo o próprio sangue, se for para evitar um novo 1964.

O exemplo daquele 3 de maio se espraiou feito pólvora por todo país. Não foi obra da iniciativa da burocracia sindical e partidária, muito menos das suas ilusões legalistas e pacifistas, ao mesmo tempo reféns e cúmplices do genocídio diário. As batalhas decisivas de maio foram obra dos mais rebeldes entre os militantes. Estes tinham, como única inspiração, ser apenas mais alguns entre os milhões de brasileiras e brasileiros que, sem tempo pra ter medo, ousam resistir – como já nos ensinava o velho comunista baiano.

Que seu vitorioso exemplo nos inspire em 2021.

VIVA ÀS HEROÍNAS E HERÓIS ANTIFASCISTAS DE 2020!

(*) Leo Silvestrin é militante da União da Juventude Comunista e do Partido Comunista Brasileiro